Data

Artigo: Quem são os adolescentes e jovens do Peru?
Por Néstor López, Coordenador de Pesquisa e Desenvolvimento do IIPE UNESCO, Escritório para a América Latina
Jovens estudiantes Peru

© MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO DO PERU/LICENÇA: HTTPS://CREATIVECOMMONS.ORG/LICENSES/BY-NC/2.0/

Quem são os adolescentes e jovens do Peru? Contribuições de uma pesquisa ao debate sobre a educação secundária peruana

Por Néstor López, Coordenador de Pesquisa e Desenvolvimento do IIPE UNESCO, Escritório para a América Latina

 

Muitas das características dos sistemas educacionais da região e, principalmente, o funcionamento diário das escolas são uma herança evidente das condições de sua fundação. Parte substancial do debate atual no campo das políticas educacionais na América Latina é a necessidade de repensar aspectos da dinâmica institucional que foram característicos do momento fundador e que hoje são um obstáculo para a realização de uma educação universal e inclusiva. Um desses aspectos tem a ver com o vínculo que a instituição de ensino estabelece, por meio de seus agentes, com cada estudante.

A maneira como os professores se relacionam diariamente com seus alunos é caracterizada, em geral, por um baixo reconhecimento de suas identidades e particularidades. Pelo contrário, pode-se argumentar que, na sala de aula, cada professor se dirige a um aluno ideal, a uma imagem específica do aluno esperado, e cada aluno acaba precisando fazer um esforço para se encaixar o melhor possível nesse perfil desejado.

No início dos sistemas educacionais, essa dinâmica diária, baseada na negação da identidade dos estudantes, foi a estratégia escolhida para a formação dos cidadãos necessários para os nascentes projetos nacionais. O importante não era conhecer cada um deles, e sim saber quem eles tinham que se tornar: o adulto produtivo e governável que o projeto de país precisava.

As críticas feitas hoje a essa modalidade de trabalho nas escolas se baseiam em pelo menos dois tipos diferentes de argumentos. Em primeiro lugar, sob a perspectiva da eficácia da política educacional, sabe-se que essa dinâmica é a base de uma parte substantiva dos altos níveis de evasão escolar da educação secundária. Conforme cada aluno se afasta, em termos de identidade e expectativas, daquele aluno médio para quem a aula foi projetada, seu desempenho cai e sua permanência na escola se torna mais problemática, levando a muitos casos de interrupção precoce. Essa característica, que algum dia foi funcional para a missão tradicional de seleção e segmentação aplicada à escola secundária, hoje se apresenta como um obstáculo à vontade de torná-la parte de um projeto de inclusão educacional. A universalização de uma educação secundária de qualidade dificilmente poderá ser atingida se as particularidades de cada estudante não forem levadas em consideração ao organizar o dia a dia nas salas de aula.

Além disso, vale destacar que essa dinâmica não é apenas pouco operacional, como também muito questionada por ser altamente discriminatória. Considerando que, na maioria dos países, a educação secundária já está incluída no período escolar obrigatório e constitui um direito que o Estado deve garantir, suas práticas precisam ser desenvolvidas em um ambiente de pleno respeito ao conjunto dos direitos humanos. Isso inclui o princípio da não discriminação, o direito ao reconhecimento de uma identidade, e o direito a ser ouvido e considerado durante a formulação e a implementação de ações que envolvam os estudantes. Consequentemente, essa dinâmica não só merece ser revista por sua baixa operacionalidade, mas também por violar certos direitos fundamentais.


 

Estudiantes Perú

© MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO DO PERU/LICENÇA: HTTPS://CREATIVECOMMONS.ORG/LICENSES/BY-NC/2.0/

 

Assim, torna-se central entender quem são os adolescentes e jovens a quem a educação secundária deve estar destinada, já que é necessário avançar em direção a estratégias educacionais que partam do reconhecimento de suas identidades e expectativas. Sob essa perspectiva, o Escritório para a América Latina do IIPE UNESCO vem desenvolvendo uma importante pesquisa no Peru, juntamente com o escritório do UNICEF no país. Concebido como uma contribuição fundamental para a estratégia de redesenho da educação secundária, conduzida pelo Ministério da Educação do Peru, o estudo visa mostrar quem são os adolescentes e jovens que habitam esse território.

O estudo parte do pressuposto de que já existe uma variedade de respostas para essa pergunta. Nas diferentes esferas da vida política e social do país, são elaboradas definições, explícitas ou não, sobre esse grupo populacional específico. Por isso, busca-se dar visibilidade e sistematizar a imagem do adolescente e da juventude de cinco perspectivas diferentes. A primeira emerge das pesquisas realizadas no meio acadêmico; a segunda é a que os principais jornais do país comunicam; a terceira é a que aparece no desenho das políticas destinadas a adolescentes e jovens; a terceira pode ser reconstruída a partir da análise das várias pesquisas realizadas pelo Estado peruano; e a quinta é a que os próprios jovens e adolescentes transmitem, a partir de um conjunto de entrevistas realizadas em diferentes lugares do país.

Estes cinco pontos de vista transmitem diferentes imagens da adolescência e da juventude do Peru. A imagem do adolescente problemático coexiste com a daquele que é a esperança do futuro, a da jovem vítima de abuso, a daquele com dinâmicas familiares complexas, a do sujeito de direitos e a do mal apelidado como “nem-nem”. Assim, muitas definições, positivas e negativas, vão se entrelaçando em um debate de absoluta relevância política. Se a definição do adolescente ou jovem é central para a definição das políticas destinadas a eles, principalmente as políticas educativas, esta pesquisa evidencia que existe uma luta intensa promovida por diferentes setores da sociedade para oferecer conteúdo a essa definição. Assim como no surgimento dos sistemas educacionais, aqui também está em jogo o modelo de país que se quer promover, e a imagem de cidadão desejada.

 

Últimas publicações